Álcool: do prazer à dependência
- Jornal A Sístole
- 18 de fev. de 2021
- 4 min de leitura

Dia Nacional de Combate ao Alcoolismo
Por: Arthur Bortone e Leandro Oliveira
O consumo de álcool esteve presente em nossa cultura desde os primórdios da humanidade. Desde as celebrações do deus Baco e suas festanças regadas ao elixir divino alcóolico, até mesmo à presença do vinho como significado do corpo de Cristo nas cerimônias cristãs; a bebida alcóolica esteve lá, com intuito cerimonialista ou simplesmente como desencargo pós um dia difícil de trabalho. Entretanto, assim como sua presença em momentos de ócio e lazer, tal consumo, quando não controlado, está diretamente atrelado a uma patologia, o alcoolismo.
Em 18 de Fevereiro, é celebrado o Dia Nacional de Combate ao Alcoolismo, data que visa conscientizar a sociedade sobre a dependência do álcool e o seu consumo exagerado. Fortalecendo o movimento, o Jornal A Sístole explicará mais sobre esta doença, o que a caracteriza, quem e quantos são afetados e como deve ser tratada.
Definição
Define-se alcoolismo, segundo o CID-10, como: ‘’um conjunto de fenômenos comportamentais, cognitivos e fisiológicos que se desenvolvem após o uso repetido de álcool, tipicamente associado aos seguintes sintomas:’’
● Forte desejo de beber
● Dificuldade de controlar o consumo (não conseguir parar de ingerir a bebida após ter começado)
● Uso continuado apesar das consequências negativas, maior prioridade dada ao uso da substância em detrimento de outras atividades e obrigações, aumento da tolerância (necessidade de doses maiores de álcool para atingir o mesmo efeito obtido com doses anteriormente inferiores ou efeito cada vez menor com uma mesma dose da substância)
● Por vezes um estado de abstinência física (sintomas como sudorese, tremores e ansiedade quando a pessoa está sem o álcool).
Vários questionários são aplicados para o correto diagnóstico do alcoolismo, devendo-se, sempre, ser acompanhado por um profissional médico, bem como uma equipe de saúde mental bem preparada, visto que, muito além de fatores biológicos, tal transtorno possui ligação direta com individualidades sociais, psíquicas e genéticas, que devem ser abordadas de acordo com suas especificidades.
Epidemiologia do alcoolismo no Brasil
Segundo dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2013 (PNS), feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia (IBGE) com cerca de 60 mil participantes:
● 13,7% da população brasileira relatou consumo abusivo de álcool nos 30 dias antes da pesquisa. Destes, 47,3% afirmam que consumiram álcool abusivamente duas vezes no mês.
● O consumo abusivo é 3,3 vezes maior entre homens se comparado a mulheres (21,6% x 6,6%)
● As maiores prevalências são vistas entre adultos jovens (de 18 a 39 anos de idade)
● Em relação à cor, a maior frequência de alcoolismo se dá, numa ordem decrescente, em: pretos (16,6%), pardos (14,4%), indígenas (12,6%) e brancos (12,4%).
● A prevalência foi menor em indivíduos sem instrução ou com ensino fundamental incompleto em relação aos mais escolarizados.
Outra importante fonte estatística é a Vigilância de Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (VIGITEL), o qual coletou informações de cerca de 2 mil moradores das 27 capitais do Brasil no ano de 2019. Além de confirmar tendências similares ao PNS de 2013, demonstrou que o consumo de álcool abusivo tende a ser maior nas capitais em relação às outras cidades e que predomina no Centro-Oeste e no Nordeste, sendo a região Sul a que conta com as menores prevalências.
Por fim, segundo dados levantados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o consumo estimado de álcool per capita no Brasil foi de 7,8L de álcool puro em 2016, uma redução se comparada aos 8,8L de 2010. Este fato coloca o Brasil abaixo da média do continente americano (8L), mas acima da média mundial (6,4L), o que pode servir como sinal de alerta para a saúde pública.
Tratamento:
Após o devido diagnóstico do alcoolismo, deve-se trabalhar a abordagem em três etapas: intervenção, desintoxicação e reabilitação. A primeira se trata do convencimento do paciente acerca de sua patologia e suas respectivas perspectivas de tratamento, sendo o diálogo, a paciência e a complacência essenciais nesse momento.
A segunda etapa, a desintoxicação, é muitas vezes complicada e com riscos sérios de recaída. É nesse momento em que há o risco de crises de abstinência leves, moderadas ou graves, que devem ser tratadas com medicações específicas (como benzodiazepínicos e antipsicóticos).
A última etapa, a de reabilitação, deve-se focar em três grandes eixos:
1- Esforços contínuos para aumentar e manter níveis elevados de motivação para abstinência;
2- Ajudar o paciente a se readaptar a um estilo de vida sem álcool;
3- Prevenção de recaída
Para a devida eficiência é necessário entender e individualizar o tratamento, entendendo os espectros únicos de cada paciente. Entender as causas, os efeitos e os porquês do consumo de álcool se tornar uma válvula de escape da realidade do indivíduo. Uma equipe multiprofissional e um trabalho de cuidado e acolhimento são essenciais para a manutenção da qualidade de vida e a remissão completa desse quadro clínico.
Referências:
BRASIL. Ministério da Saúde. Vigitel Brasil 2019 : vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico : estimativas sobre frequência e distribuição sociodemográfica de fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal em 2019. Brasilia, 2020. Disponível em: vigitel_brasil_2019_vigilancia_fatores_risco.pdf (saude.gov.br). Acesso em: 29 jan. 2021.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Relatório Global sobre Álcool e Saúde. Genebra, 2018. Disponível em: https://www.who.int/publications/i/item/9789241565639. Acesso em: 29 jan. 2021.
GARCIA, L. P.; FREITAS, L. R. S. Consumo abusivo de álcool no Brasil: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde 2013. Epidemiol. Serv. Saúde, Brasília, 24 (2): 227-237, abr-jun 2015. Acesso em: https://scielosp.org/pdf/ress/2015.v24n2/227-237/pt. Acesso em: 29 jan. 2021.
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American Psychiatric Association – APA, 2013. Diagnostic and Statistical Manu
KAPLAN, HI. & SADOCK, B. Compêndio de Psiquiatria. 9ª edição. Porto Alegre: Artes Médicas, 2007.
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