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UMA CONVERSA SOBRE O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA

  • Foto do escritor: Jornal A Sístole
    Jornal A Sístole
  • 8 de abr. de 2021
  • 5 min de leitura

Por Leandro Oliveira e Thalita Sodré


Mesmo após quase 80 anos da sua descoberta, poucos temas do desenvolvimento neurológico e psiquiátrico infantil intrigam tanto pesquisadores, profissionais de saúde e a população em geral como o autismo. Inicialmente postulado como fruto de “má educação parental” e uma forma de esquizofrenia, o transtorno do espectro autista (TEA) - termo referente à larga variabilidade de comprometimento observado entre os indivíduos afetados - é hoje reconhecido como uma entidade própria no universo dos distúrbios do desenvolvimento, ligada a fatores genéticos, ambientais e do desenvolvimento fetal, e que afeta uma em cada 160 crianças no mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).


Visto que o autismo é cercado de vários mitos e estigmatizado por parte da sociedade, o Jornal A Sístole versará sobre o que é, como surge, quem é mais afetado e como tratar o autismo para conscientizar o leitor sobre a realidade do tema.


O que é o autismo?

O TEA é um distúrbio de desenvolvimento neurológico heterogêneo, relacionado a alterações cognitivas e, às vezes, sensoriais. De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais V (DSM-V), alguns dos principais elementos comportamentais que o caracterizam são:


Déficits persistentes em comunicação e interação social - contato físico inapropriado, dificuldade de manter conversas, adotar gestos e contato visual adequados, demonstrar e interpretar emoções, e usar tons de voz compatíveis com a situação. Pode haver também o desinteresse ou a incapacidade de iniciar relacionamentos ou participar de atividades coletivas.


Padrões repetitivos de comportamento - tendência a repetir palavras ditas por si ou por outros (ecolalia), cantarolar os mesmos sons frequentemente, realizar movimentos manuais específicos, adotar postura anormal, alinhar objetos, interagir com portas e luzes de forma repetitiva. Também inclui excessiva resistência a mudanças de rotina e obsessão pelas mesmas atividades e interesses.


Reações ou interesses anormais a elementos sensoriais - alta tolerância à dor, calor ou frio se julgá-los interessantes, resposta exacerbada a sons ou ao toque em texturas específicas, extrema fascinação com luzes e objetos em movimento, além de tocar ou cheirar objetos em demasia.


Tais elementos estão presentes desde a infância, desenvolvendo-se geralmente até os 8 anos de idade e são fatores limitantes à realização de atividades diárias, inexplicáveis por deficiências intelectuais ou atraso global no desenvolvimento neuropsicomotor.

Além dos sinais e sintomas já citados, é comum que o TEA se associe a distúrbios neurológicos ou psiquiátricos, como o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, ansiedade, depressão e epilepsia.


Qual é a causa do autismo?

O TEA é um transtorno multifatorial, fruto da interlocução entre fatores genéticos, ambientais e comportamentais. Mais de 100 genes e regiões genômicas, ou seja, áreas do nosso DNA que contêm informações importantes para o funcionamento do organismo, foram associadas à condição e podem se expressar, nesse caso, com a alteração de diversas regiões do cérebro ao longo do desenvolvimento do sistema nervoso no paciente acometido.


Tais alterações podem ser herdadas, explicando a correlação entre história familiar de autismo e desenvolvimento do transtorno, contudo, uma mesma mutação não irá, necessariamente, gerar quadros iguais de TEA. Isso dependerá das condições de desenvolvimento do indivíduo e de suas interações com o ambiente, as quais são diversas e contribuem para a existência do espectro característico.


Pouco se sabe sobre a fisiopatologia do TEA, mas alguns estudos em crianças e bebês sugeriram alterações funcionais e estruturais cerebrais existentes anteriormente à aparição clínica do transtorno, ou seja, ao surgimento dos sinais e sintomas discutidos acima.


Quem e quantos são os afetados pelo autismo?

O estudo 2010 Global Burden of Disease estimou que havia cerca de 52 milhões de autistas no mundo. Outros estudos epidemiológicos apontam que o autismo é mais comum em homens que mulheres, numa proporção de 2:1 a 5:1.


Alguns dos principais fatores predisponentes ao TEA são: história familiar de autismo, hipóxia neonatal, idade avançada dos pais, prematuridade, uso de ácido valpróico durante a gravidez e diabetes mellitus gestacional. Vale ressaltar que as vacinas não causam autismo e que o uso suplementar de ácido fólico é um fator protetivo.


Não há dados da prevalência de autismo no Brasil, mas estima-se que cerca de 2 milhões de brasileiros convivem com o transtorno. Desde 2020, por força da Lei 13.861/2019, dados oficiais sobre TEA vêm sendo coletados pelo Censo do IBGE, o que futuramente contribuirá para a compreensão do cenário nacional.


O tratamento do autismo e a importância da Comunicação Social

O tratamento para o TEA deve começar rapidamente e ainda na infância, mesmo que seja apenas uma suspeita. Por ser uma doença multifatorial e impactada por vários fatores do meio, necessita de terapia coordenada por uma equipe interdisciplinar, isto é, composta por vários profissionais de saúde em amplo diálogo - como médico pediatra especialista, fisioterapeutas, psicólogos e fonoaudiólogos - para garantir as melhores condições do ambiente para a criança.


O objetivo dessa união é melhorar o desenvolvimento social e comunicativo do indivíduo, além de garantir um fluido desenvolvimento intelectual, visando à redução dos danos da doença, melhora da qualidade de vida - para a criança e para a família - e maior autonomia de acordo com sua faixa etária.


O tratamento para o TEA é minucioso e trabalhoso: deve ser priorizado e explicado para a família, de forma que tratamentos sem eficácia científica não ganhem força.


Reduzir o prejuízo à comunicação social, um dos sinais que mais chamam a atenção de pessoas externas e que preocupa a família da criança, é uma prioridade no tratamento do TEA. Os indivíduos com TEA têm dificuldade para entender as intenções e os estados mentais subjetivos alheios, como sentimentos expressos, linguagem corporal e pensamentos. Assim, eles podem aparentar frieza ou indiferença perante a tristeza ou felicidade nos gestos de uma pessoa, mas isso não é proposital. Segundo a chamada “Teoria da Mente”, tais habilidades, se bem desenvolvidas, nos dão a capacidade de interagir e nos envolver socialmente, portanto, elas devem ser precocemente estimuladas nas crianças com autismo a fim de melhorar seu desenvolvimento intelectual e emocional.


Como seres sociais, a abordagem multidisciplinar dessas crianças a partir de interações na escola e em casa, como diálogos diários, brincadeiras e jogos que estimulem o contato com outros indivíduos, em geral, pode trazer resultados extremamente positivos para a qualidade de vida da criança autista. Nesse sentido, é preciso uma orientação cuidadosa para os pais e demais familiares, bem como para os profissionais educadores que enfrentam um grande desafio. Não existe uma fórmula pré-estabelecida para a realização desses processos aqui esclarecidos, mas sim a necessidade de se informar continuamente e, apesar de o caminho ser árduo, os resultados podem ser impressionantes.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


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Manual de Orientação: Departamento Científico de Pediatria do Desenvolvimento e Comportamento, Disponível em: (https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/21775d-MO_-_Transtorno_do_Espectro_do_Autismo__2_.pdf), Acesso em 14/03/2021, às 08h01.


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LORD, C.; BRUGHA, T. S.; CHARMAN, T.; CUSACK, J.; DUMAS, G.; FRAZIER, T.; JONES, E. J. H.; JONES, R. M.; PICKLES, A.; STATE, M. W.; TAYLOR, J. L.; VEENSTRA-VANDERWEELE, J. Autism spectrum disorder. Nature Reviews Disease Primers, v. 6, n. 5, p. 1-23, 2020. Disponível em: https://www.nature.com/articles/s41572-019-0138-4. Acesso em: 14 mar. 2021



 
 
 

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