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TURISMO SEXUAL NO BRASIL: A colonização de corpos femininos

  • Foto do escritor: Jornal A Sístole
    Jornal A Sístole
  • 24 de fev. de 2022
  • 4 min de leitura


Por Karine M. Corrêa e Ramila C. L. Tostes


Talvez você nunca tenha ouvido falar do turismo sexual mas, ainda assim, o Brasil é um dos principais destinos dessa danosa cultura. De acordo com a Organização Mundial do Turismo, o turismo sexual corresponde à organização de viagens com o objetivo primário de relação sexual do turista com pessoas residentes do destino em questão. Para além disso, a prática está correlacionada com a exploração e abuso sexual, pedofilia, tráfico de crianças, adolescentes e mulheres, com a prostituição, tráfico de drogas e com outras formas de crimes. Além disso, a existência dessa atividade está intimamente associada com o desemprego, a exclusão social, a falta de escolaridade e de moradia. Considerando a urgência dessa abordagem e do combate ao turismo sexual, a equipe do Jornal “A Sístole” deseja promover uma reflexão sobre o tema.


Nesse panorama, encontra-se enraizado o histórico brasileiro de um país colonizado por homens europeus brancos e que carrega, portanto, o estigma e as consequências de uma nação roubada e desfavorecida em diversos âmbitos da sociedade civil. Assim sendo, no que tange ao recorte de sexualização, o corpo da mulher brasileira, no contexto contemporâneo, é visto como propriedade alheia, bem como ocorreu, outrora, com todo o território do Brasil. À medida que o patriarcado adentra os limites do nosso país e inventa a figura feminina como provedora de cuidado, subserviência e inferioridade política, é criada essa falsa e dolorosa crença de que algo DELAS pertence a ELES. Tendo sido o último país a abolir a escravidão, o cenário torna-se ainda mais danoso à mulher preta brasileira, historicamente colocada como servidora dentro da estrutura capitalista. Outrossim, com todas as dificuldades de um país subdesenvolvido, que tenta se reerguer a partir de uma imposição do sistema exploratório, a política brasileira pouco se atenta ao desenvolvimento educacional do povo aqui residente, atrasando a inserção da população em movimentos sociais como o feminismo, a universidade popular e a luta anticolonial.


Ao ser tratada como nação periférica, a cultura brasileira mostra-se atrativa pelo contexto exótico, desconhecido e primitivo que é colocado para os países mais desenvolvidos. É dessa forma, portanto, que o modo de se vestir, falar, andar e se expressar da mulher brasileira não é visto como algo típico do país Brasil e sim, apenas, como algo atípico aos olhos de quem vem de fora, o que corrobora com a desvalorização de nossos costumes, a fim de torná-los passíveis de interpretações que favorecem os estrangeiros.


Além disso, o crescimento do turismo de visitação no Brasil é desordenado, favorecendo a exclusão social dos moradores da localidade que, muitas vezes, são mão-de-obra barata para o setor. Como consequência da negligência das autoridades e da falta de legislação em determinados locais, o turismo sexual cresce em uma tentativa de geração de renda pela população marginalizada. Cabe ressaltar que tal prática só é possível com a coparticipação dos autores ou omissão dos envolvidos no turismo, tais como agências de viagem, hotéis, bares e restaurantes, garçons, porteiros, caminhoneiros e taxistas, bem como prostíbulos e casas de massagem.


Nesse contexto, as principais vítimas dessa prática são mulheres, adolescentes e crianças, geralmente negras e com baixo poder aquisitivo, oriundas de regiões onde a pobreza é predominante. É difícil mensurar os casos de turismo e exploração sexual no Brasil, visto que não são todos que entendem a atividade como algo a ser denunciado. Cabe ressaltar que no Brasil a prostituição não é considerada crime, mas tirar proveito da prostituição alheia é crime. Apesar disso, no cenário da Copa do Mundo de 2014, um levantamento demonstrou que mais de 3 mil sites foram criados entre 2013 e 2015 para vender pornografia ou turismo sexual no Brasil. Em 2018, uma pesquisa realizada pelo Datafolha apontou que 24% dos entrevistados já presenciaram uma situação de exploração sexual infantil, sendo que 74% deles não denunciaram. Além de tudo, esses números reforçam a urgência da conscientização e debate sobre o tema.


Intrinsecamente relacionada à situação de vulnerabilidade social que essas mulheres convivem, está a saúde pública de um país sujeito ao turismo sexual. Questionamentos importantes, tais como a estabilidade psíquica de pessoas vítimas de violência ou que necessitam vender seus corpos para sobreviverem, o alto índice de transmissão de Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs), a carência nutricional, os hábitos noturnos, a exposição a infecções respiratórias e intestinais de outras localidades e a marginalização dentro dos serviços saúde devem ser colocados em pauta dentro dessa temática. Torna-se necessário pensar, portanto, não só no desmonte coletivo envolvido no turismo sexual, mas também no processo adoecedor no qual as mulheres inseridas nessa indústria estão submetidas.


O combate ao turismo sexual envolve diversas medidas, tais quais a criação de políticas públicas que objetivem tanto a redução do abuso e exploração sexual infanto-juvenil, como também do turismo sexual como um todo. Alguns exemplos de projetos já existentes são o Disque 123 da Paraíba que recebe denúncias de violação dos direitos humanos anonimamente; em Alagoas, o “Promova a Paz” tem como objetivo estimular crianças e adolescentes a denunciarem casos de exploração sexual; em 2014, no Rio de Janeiro, o Ministério do Turismo promoveu uma campanha de conscientização sobre o turismo sexual em comunidades, com ação semelhante sendo realizada em São Paulo. Em suma, apesar de existirem algumas ações pontuais ainda há muito a ser feito com o objetivo de erradicar o turismo sexual no país e as suas consequências.



REFERÊNCIAS

Marques, F. T., & Guzzi, R. O TURISMO SEXUAL NA CONTEMPORANEIDADE: CASOS FREQUENTES E A LEGISLAÇÃO PERTINENTE. Ciências Sociais Aplicadas em Revista, 18(35), 146-160.

Zaremba, J. Turismo sexual é controlado por máfias e fica à margem de estatísticas: Para especialista, baixa notificação da atividade tem relação com medo de represálias. Exploração Sexual Infantil, 3. ed. Folha de São Paulo, 18 maio 2019. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/seminariosfolha/2019/05/turismo-sexual-e-controlado-por- mafias-e-fica-a-margem-de-estatisticas.shtml. Acesso em: 21 jan. 2022.

BLANCHETTE, T. G.; SILVA, A. P. DA. "A Mistura Clássica": miscingenãção e o apelo do Rio de Janeiro como destino para o turismo sexual. Bagoas - Estudos gays: gêneros e sexualidades, v. 4, n. 05, 27 nov. 2012.

SANTOS, Alessandro & FIGUEIREDO, Regina. Agravos à saúde e relacionamentos afetivo sexuais em comunidades anfitriãs do turismo. Disponível em: http://barong.org.br/publicacoes/artigo-2008_agravos-a-saude-em-comunidades-do- turismo_[prevencao-turismo-lazer-barong].pdf

 
 
 

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