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Transplante de órgãos: entre a vida e a bioética

  • Foto do escritor: Jornal A Sístole
    Jornal A Sístole
  • 17 de fev. de 2022
  • 4 min de leitura


Por Orlando Dias Canichio

Não é novidade para ninguém que, no Brasil, a demanda por doações de órgãos ou tecidos é maior do que o número de doadores. Mais de 50 mil pessoas estão na fila para transplantes e, destes, temos aqueles esperando por um rim (31.125), por córnea (19.115), por fígado (1.905), pelo transplante duplo de pâncreas e rim (387), por um coração (365) e por pulmão (259). Nesse contexto, desde a desinformação até crenças religiosas, quem sofre são os milhares de pacientes esperando por uma cirurgia que pode salvar suas vidas.


​Segundo o Ministério da Saúde, esse procedimento é “um ato por meio do qual podem ser doadas partes do corpo, sejam órgãos ou tecidos de uma pessoa (doador), para serem utilizados no tratamento de outra pessoa (receptor), com a finalidade de restabelecer as funções de um órgão ou tecido doente”. Assim, o órgão ou tecido afetado será substituído pelo mesmo de uma pessoa sadia.


​Diversos conceitos são importantes quando se fala em doação de órgãos, e um deles é o de morte encefálica. Em linhas gerais, ela ocorre quando há perda completa ou irreversível de funções corticais e do tronco encefálico, inevitavelmente levando à morte do indivíduo, apesar de ainda haver batimentos cardíacos (mas com respiração apenas por ajuda de aparelhos). Nesse caso, podem ser doados rins, fígado, coração, pulmões, pâncreas, intestino, córneas, valvas cardíacas, pele, ossos e tendões.


​Além disso, segundo a Lei nº 9.434/2017, a chamada “Lei dos Transplantes”, a doação dos órgãos só pode ser feita se for constatada morte encefálica, feita por médicos capacitados, a partir de dois exames clínicos, com intervalo de pelo menos uma hora, feitos por profissionais diferentes. No caso de morte por parada cardiorrespiratória, podem ser doados apenas tecidos, como é o caso da pele, da córnea e dos ossos.


​Um dos grandes destaques para a doação de órgãos é o nosso Sistema Único de Saúde. Aproximadamente 95% dos transplantes realizados no Brasil são pelo SUS e, fora isso, o Ministério da Saúde é responsável pelo financiamento total desse processo. Ou seja, a realização de exames (para compatibilidade do paciente com o doador), o transporte (que pode ser feito via terrestre e aérea por uma equipe especializada) e a equipe médica (responsável pela cirurgia) são subsidiados pelo Estado.


​Na contramão de todo esse movimento, há a desinformação. Apesar de não haver justificativas racionais para uma pessoa, ou familiar, que tenha uma pessoa falecida com potencial de ser doadora, ainda há quem se recuse a doar. Estudos feitos em Pelotas (RS) apontam fatores religiosos como grandes impactantes nessa decisão, principalmente evangélicos e testemunhas de Jeová. Além disso, fatores como a idade acima de 45 anos,baixo nível educacional, pouco ou nenhum conhecimento acerca de morte encefálica e medo da manipulação cadavérica foram as principais desfavoráveis à doação. Dentre suas razões principais, temos o desconhecimento de como ser doador e o medo de diagnóstico errado de morte (morte aparente).


​Muitas polêmicas judiciais também estão envolvidas na doação. Regulamentada no final do século passado, a Lei 9.434 de 04 de fevereiro de 1997 incluía a doação presumida, com o estabelecimento dos critérios para definição de morte encefálica, tendo uma nova resolução em 2017. Nela, há a exigência de que um dos médicos deve ter ao menos um ano de experiência no atendimento de pacientes em coma e ter acompanhado, ou determinado, pelo menos dez confirmações de morte encefálica, ou ter participado de curso de capacitação para tal. Fora isso, há um projeto de lei (PLS 405/2012) de autoria do Senador Humberto Costa (PT/PE) que altera essa lei, determinando que todos os indivíduos são potenciais doadores de órgãos e, caso alguém não tenha essa vontade, deve haver uma manifestação de “não doador de órgãos e tecidos” em documento público de identidade.


​Assim, há muito ainda a se pensar sobre essa questão. Seja pelo lançamento de campanhas de incentivo do Ministério da Saúde ou por ações interativas, como seminários, dirigidas a determinados grupos (jovens, trabalhadores da saúde, legisladores, e assim por diante), utilizando os novos meios de comunicação (mídias sociais), visando, principalmente, atribuir mais valor social à doação, em uma espécie de marketing social com a população.


Por fim, três dos aspectos mais importantes são conciliar os interesses dos que necessitam de órgãos (e de possíveis doadores) com a opinião da sociedade em geral, a articulação sistêmica entre legislação, publicidade, formação e organização de protocolos, além do financiamento adequado para que o aumento de doadores e transplantes seja mais rápido e consistente (capacitação de profissionais de saúde para melhor eficiência do processo, além da logística envolvida em transportes muito distantes).

REFERÊNCIAS

MAIS de 50 mil pessoas esperam na fila para serem transplantadas no Brasil: No Dia Nacional da Doação de Órgãos, dados mostram que pandemia afeta as cirurgias; número de doadores caiu 13% no primeiro semestre de 2021. CNN saúde, [S. l.], p. 1-1, 27 set. 2021. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/saude/mais-de-50-mil-pessoas-esperam-na-fila-para-serem-transplantadas-no-brasil/. Acesso em: 24 jan. 2022.

TRAIBER, Cristiane; LOPES, Maria Helena Itaqui. Educação para doação de órgãos. Sci Med, v. 16, n. 4, p. 178-82, 2006.

Coelho, Gustavo Henrique de Freitas e Bonella, Alcino Eduardo. Doação de órgãos e tecidos humanos: a transplantação na Espanha e no Brasil. Revista Bioética [online]. 2019, v. 27, n. 3 [Acessado 24 Janeiro 2022] , pp. 419-429. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/1983-80422019273325>. Epub 26 Set 2019. ISSN 1983-8034. https://doi.org/10.1590/1983-80422019273325.

GOVERNO Federal, por meio do Ministério da Saúde, lança campanha para incentivar doação de órgãos. 27 set. 2021. Disponível em: https://www.gov.br/pt-br/noticias/saude-e-vigilancia-sanitaria/2021/09/governo-federal-por-meio-do-ministerio-da-saude-lanca-campanha-para-incentivar-doacao-de-orgaos. Acesso em: 24 jan. 2022.

SISTEMA Nacional de Transplantes. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/composicao/saes/snt#:~:text=O%20que%20%C3%A9%20doa%C3%A7%C3%A3o%20de,um%20%C3%B3rg%C3%A3o%20ou%20tecido%20doente. Acesso em: 24 jan. 2022.

 
 
 

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