Negacionismo científico: o que é e quais são as causas
- Jornal A Sístole
- 1 de fev. de 2022
- 3 min de leitura

Por Karine Teotônio
Os irmãos Hoofnagle, advogado e fisiologista norte-americanos, que muito fizeram para desenvolver o conceito de negacionismo, o definiram como o emprego de argumentos retóricos que dão a aparência de debate legítimo quando, na verdade, há o objetivo final de rejeitar uma proposição sobre a qual existe um consenso científico. Negacionismo significa, portanto, a ação de negar ou não reconhecer como verdadeiro um fato ou um conceito que pode ser verificado na prática.
Essa ideia de negação à ciência não é algo criado nos dias atuais, pelo contrário, é um fenômeno antigo. No início da Idade Moderna, por exemplo, autoridades religiosas ajudaram na propagação da negação dos avanços científicos e das reflexões dos filósofos humanistas. Para calar quem trouxesse a ciência para o debate, eles usavam o poder físico, político e religioso que possuíam e executavam na fogueira pessoas que falassem sobre progresso.
Na última década, o negacionismo passou das margens para o centro do discurso público, ajudado, em grande parte, pela tecnologia. Apesar da informação tornar-se cada vez mais democrática em virtude da disponibilização online e das oportunidades de se combater o analfabetismo científico aumentarem, a abertura dessas ferramentas a qualquer pessoa de posse de um navegador da web contribui para a propagação de negacionistas e negacionismos, ao aumentar o alcance de tais vozes. Assim, a pura liberalidade de vozes, a pluralidade de opiniões e a dissonância da polêmica são suficientes para fazer qualquer um duvidar daquilo em que se deve acreditar.
É possível ressaltar dois movimentos negacionistas, que, ainda hoje, possuem uma boa influência sobre quem acredita em teorias conspiratórias:
➢ O primeiro movimento é a teoria da Terra Plana. Mesmo depois de mais de 2 mil anos de ciência e conceitos comprovados, os terraplanistas, como são apelidados, distorcem a ciência por ignorância, ingenuidade ou, até mesmo, maldade, visando atender aos interesses daqueles que sustentam esse discurso,seja por desconfiança daNASA e do governo norte-americano, por exemplo, seja por crenças religiosas. É possível compreender um pouco mais do mundo dos terraplanistas no documentário da Netflix “A Terra é Plana” de 2019.
➢ O segundo movimento, considerando o contexto de pandemia que estamos inseridos, é ainda mais preocupante, o movimento antivacina. A Organização Mundial da Saúde (OMS), divulgou, em 2013, uma lista que apontava as 10 maiores ameaças à saúde e, entre elas, estava o medo e a desinformação sobre as vacinas.
Mas por que isso acontece?
Freud, pai da psicanálise, defendia que era uma reação diante de ameaças à estabilidade da própria consciência, ou seja, aquilo que foge ao alcance do que é palpável e da nossa capacidade imaginativa pode gerar medo, desconforto e sensação de impotência, fazendo-nos entrar em estado de negação. São criadas, assim, as teorias conspiratórias e os negacionismos científicos. Além da questão individual, a propagação da negação pode estar relacionada a ganhos políticos e econômicos de determinados grupos que enganame massificam teorias sobre eventos, fatos históricos e/ou questões científicas que desconhecem.
Como lidar com o negacionismo?
A resposta acadêmica normal a um argumento oposto é se envolver com ele, testando os pontos fortes e fracos das diferentes visões, na expectativa de que a verdade emergirá por meio de um processo de debate. No entanto, isso requer que ambas as partes estejam dispostas a olhar para a evidência como um todo, rejeitar distorções deliberadas e aceitar princípios de lógica.
Por fim, apenas o debate e a crítica muitas vezes não conseguem alcançar os princípios da estruturação do próprio fenômeno na tentativa de impedir seu avanço. É preciso pensar, portanto, em métodos de neutralização dessas estruturas tão diversificadas e, de certa forma, duradouras.
Referências
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