Liberação do uso de máscaras: cedo demais?

Por Luiza Lino e Stella Benjamin

Situação no Brasil?

Após o decreto do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, desobrigando o uso da máscara na capital federal, o Ministério da Saúde também optou por retirar a obrigatoriedade do item de segurança em sua sede, segundo nota informativa divulgada na segunda-feira (21/03). Além do Distrito Federal, ao menos 20 outras unidades federativas já tornaram facultativo o uso de máscaras.

São Paulo, Rio de Janeiro, Natal, Maceió, Porto Velho, Florianópolis, Porto Alegre e Distrito Federal tornaram o uso de máscaras opcional em qualquer ambiente, seja este aberto ou fechado. Já Belo Horizonte, Cuiabá, São Luís, Boa Vista, Macapá, Campo Grande, Vitória, Teresina, Rio Branco, Manaus, Goiânia, Curitiba e João Pessoa adotaram a flexibilização apenas em espaços abertos, como ao ar livre.

Segundo o Comitê Especial de Enfrentamento à Covid-19 (CEEC), da Prefeitura do Rio, após reunião na segunda-feira (07/03), o uso de máscara se tornou facultativo tanto em ambientes fechados como abertos na cidade do Rio de Janeiro. Já na cidade de Macaé, desde o dia 22 de março, está desobrigado o uso de máscaras em ambientes abertos e fechados do município, de acordo com o decreto 066/2022. Contudo, mantém-se a recomendação de uso para os usuários do transporte coletivo, pessoas que frequentam instituições de ensino públicas e privadas, instituições bancárias, asilos e instituições de longa permanência, unidades de saúde, terminais rodoviários e aeroportuários, pessoas com sintomas respiratórios, imunossuprimidas, gestantes e idosos acima de 60 anos.

O que dizem os cientistas?

Em novo boletim, o Observatório Fiocruz Covid-19 destaca o abandono prematuro das medidas protetivas diante do cenário atual. Os pesquisadores responsáveis pelo boletim afirmam que é preciso ter cuidado nessa flexibilização:“Flexibilizar medidas como o distanciamento físico ou o abandono do uso de máscaras de forma irrestrita colabora para um possível aumento de casos, internações e óbitos, e não nos protege de uma nova onda”, afirmam os pesquisadores.

“O aumento de casos, mesmo entre vacinados, aumenta a demanda de hospitalizações e, possivelmente, os óbitos. Atualmente, o ideal é voltarmos ao padrão do início da pandemia, quando recomendávamos fortemente o uso de máscaras, higienização de mãos e evitar as aglomerações”, explicam. Além disso, os pesquisadores pontuam que “a maior vulnerabilidade das crianças, provocada principalmente pela baixa adesão deste grupo à vacinação, compromete igualmente o grupo que se encontra no extremo oposto da pirâmide etária”.

Quem ainda precisa usar?

1 - Imunossuprimidos ou Imunodeprimidos

A imunossupressão corresponde a uma diminuição da resposta imune devido ao uso de algumas medicações, como corticoides e agentes imunoterápicos (utilizados no tratamento de algumas doenças autoimunes). Já a imunodepressão corresponde a uma diminuição da resposta imune devido a certas doenças, como o HIV e o câncer. Em ambos os casos, o sistema imune da pessoa está fragilizado, tornando-a mais suscetível a contrair infecções. Vale ressaltar que, para aqueles que convivem com pessoas nessas condições, também é importante manter as medidas de prevenção, incluindo o uso das máscaras.

2 - Pessoas com comorbidades

As comorbidades são condições clínicas que podem aumentar a chance do desenvolvimento de manifestações mais graves da COVID-19, caso a pessoa seja infectada pelo vírus. São exemplos de comorbidades: obesidade, diabetes mellitus, hipertensão arterial sistêmica, insuficiência cardíaca, doença renal crônica, anemia falciforme e cirrose hepática.

3- Idosos

O envelhecimento do sistema imunológico, denominado imunossenescência, torna os idosos um grupo mais suscetível às manifestações graves e complicações da COVID-19. Além disso, também em virtude desse fenômeno, que é natural, a efetividade das vacinas nessa população pode não ser a mesma daquela apresentada para as demais faixas etárias. Por fim, um aspecto que também justifica a permanência do uso de máscaras pelos idosos é que as comorbidades aumentam de maneira proporcional à idade.

4 - Não vacinados ou esquema vacinal incompleto

Todos aqueles que não se vacinaram (não receberam nenhuma dose da vacina) e que estão com o esquema vacinal incompleto (receberam apenas uma dose ou ainda não tomaram a dose de reforço) estão mais suscetíveis a serem infectados pelo vírus.

5- Crianças

A cobertura vacinal entre as crianças ainda é pequena, o que as torna mais vulneráveis à contaminação pelo vírus. Além das crianças de 0 a 4 anos ainda não estarem sendo vacinadas, segundo a Fiocruz, entre as crianças de 5 a 11 anos, apenas 39,3% tomaram a primeira dose da vacina no Brasil. Quando se trata da segunda dose, a taxa de cobertura é ainda menor nessa faixa etária: 4,7%.

6- Profissionais da saúde e outros trabalhadores

No caso dos profissionais de saúde, considerando o risco aumentado que o ambiente hospitalar oferece, a máscara cirúrgica e a N95, a depender do nível de exposição, fazem parte dos equipamentos de proteção individual (EPIs) e, portanto, são de uso obrigatório.

Em relação a outros trabalhadores, para aqueles cujo ambiente de trabalho envolve uma grande circulação de pessoas (transporte público, por exemplo), é válido considerar manter o uso das máscaras durante o expediente, em virtude da maior exposição ao risco de contaminação.

Veio para ficar?

No Japão o uso da máscara já fazia parte do cotidiano das pessoas muito antes da

pandemia de COVID-19. Registros históricos mostram que, durante o período Edo (1603-1868), os japoneses cobriam o rosto com um pedaço de papel ou com um ramo de sakaki (planta considerada sagrada em algumas regiões do país) para impedir que seu "hálito sujo" saísse. No entanto, foi no início do século XX, durante a pandemia da gripe espanhola, que o uso das máscaras foi incorporado aos hábitos dos japoneses. Na época, o Japão possuía 57 milhões de habitantes. Somente no país, a gripe espanhola foi responsável por infectar cerca de 23 milhões de pessoas, quase metade da população, das quais 390.000 morreram. Na ocasião, a estratégia utilizada pelo governo japonês, baseada na vacinação, no isolamento e no uso de máscaras, contribuiu para controlar a crise, fazendo com que as pessoas assumissem esse hábito de proteção como parte de seus costumes.

No Brasil, a COVID-19 já soma 29,6 mi de casos e 657 mil mortes (dados de 21/03/22). Será que esses números também servirão de aprendizado e deixarão suas marcas nos nossos hábitos futuros?

Referências:

CSSEGISandData. COVID-19 Data Repository by the Center for Systems Science and Engineering (CSSE) at Johns Hopkins University [Internet]. GitHub. 2020. Available from: https://github.com/CSSEGISandData/COVID-19

Quais casos são considerados imunossupressão e podem tomar a vacina contra Covid-19? – BVS Atenção Primária em Saúde [Internet]. [cited 2022 Mar 21]. Available from: https://aps.bvs.br/aps/quais-casos-sao-considerados-imunossupressao-e-podem-tomar-a- vacina-contra-covid-19/

Máscara contra a Covid-19: quem deve usar mesmo com o fim da obrigatoriedade? [Internet]. G1. [cited 2022 Mar 21]. Available from: https://g1.globo.com/saude/coronavirus/noticia/2022/03/08/mascara-contra-covid-19-quem- deve-usar-mesmo-com-o-fim-da-obrigatoriedade.ghtml

Nota Técnica -Observatório Covid-19 -Fiocruz Diferenciais De Cobertura Vacinal Segundo Grupos Etários No Brasil [Internet]. [cited 2022 Mar 21]. Available from: https://agencia.fiocruz.br/sites/agencia.fiocruz.br/files/u34/notatecnica_diferenciaisporgrupoe tario.pdf

Ministério da Saúde acaba com obrigatoriedade de máscara em sua sede. [Internet]. Metrópoles. [cited 2022 Mar 23]. Available from: https://www.metropoles.com/brasil/ministerio-da-saude-acaba-com-obrigatoriedade-de- mascara-em-sua-sede

Macaé desobriga uso de máscaras em ambientes fechados. Prefeitura Municipal de Macaé. [Internet]. [cited 2022 Mar 23]. Available from: https://macae.rj.gov.br/noticias/leitura/noticia/macae-desobriga-uso-de-mascaras-em- ambientes- fechados#:~:text=Para%20pessoas%20que%20apresentam%20sintomas,com%20o%20de creto%20060%2F2022.

Comitê de Enfrentamento à Covid-19 recomenda o uso facultativo de máscaras no Rio. Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro. [Internet]. [cited 2022 Mar 23]. Available from: https://prefeitura.rio/saude/comite-de-enfrentamento-a-covid-19-decide-sobre-liberacao-do- uso-de-mascaras-no- rio/#:~:text=O%20Comit%C3%AA%20Especial%20de%20Enfrentamento,do%20Di%C3%A 1rio%20Oficial%20do%20Munic%C3%ADpio.

Pelo menos 20 capitais e o Distrito Federal já flexibilizaram uso de máscaras. [Internet]. CNN Brasil. [cited 2022 Mar 23]. Available from: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/pelo-menos-20-capitais-e-o-distrito-federal-ja- flexibilizaram-uso-de-mascaras/

Fiocruz alerta sobre riscos da flexibilização de medidas protetivas. CNN Brasil. [cited 2022 Mar 23]. Available from: https://www.cnnbrasil.com.br/saude/fiocruz-alerta-sobre-riscos-da- flexibilizacao-de-medidas-protetivas/