top of page
Buscar

Elucidando termos: Necropolítica, Interseccionalidade e Saúde

  • Foto do escritor: Jornal A Sístole
    Jornal A Sístole
  • 8 de fev. de 2022
  • 3 min de leitura



Você sabe o que é Necropolítica?

Necropolítica, ou Política da Morte, foi um conceito criado pelo filósofo camaronês Achille Mbembe.

Mbembe parte do conceito de Michel Focault denominadobiopoder. Para Focault, o capitalismo após o final do século XIX se reorganizou, de modo que o Estado passou a ter poder concreto sobre o corpo dos cidadãos. Isso pode parecer estranho à primeira vista, mas é muito verificável na prática, já que o Governo é hoje responsável por medidas como o saneamento básico e a construção e gestão de hospitais que impactam diariamente sobre o corpo e a vida humanos. Nessa questão, para Foucault, o racismo é elemento central por estar presente na gênese dos Estados contemporâneos, de forma que as localidades em que se nota a ausência das medidas de Saúde, Educação e Segurança são justamente os locais da estratégia do racismo de Estado. Nas palavras de Foucault:


“Quase não há funcionamento moderno do Estado que, em certo momento, em certo limite, em certas condições, não passe pelo racismo.”


Desse modo, a hierarquização da sociedade se dá por meio de uma divisão entre “aqueles que devem permanecer vivos” - com ampla assistência do Estado - e aqueles que “devem ser deixados para a morte” - com ausência dessas medidas. Mbembe não apenas utiliza essa teoria, mas a revoluciona para a criação do conceito de Necropolítica, ou Política da Morte.

Para Mbembe, o capitalismo como conhecemos hoje mudouainda mais essas relações de poder. Tem-se agora um cenário de Morte de Regulação: o Estado passa a produzir ativamente a morte como mecanismo de controle, no qual as minorias raciais não devem ser incorporadas à dinâmica de circulação do capital, a fim de manter a ordem social preponderante.


E Interseccionalidade?

O debate acerca da interseccionalidade teve início entre os anos 1970 e 1980- em lutas e teorizações dos movimentos feministas negros-nos Estados Unidos e no Reino Unido. No entanto, o conceito foi estruturado apenas em 1989, por Kimberlé Crenshaw, defensora dos direitos civis, teórica feminista, especialista em questões de raça e gênero e professora estadunidense. Segundo Crenshaw:


"A interseccionalidade é uma conceituação do problema que busca capturar as consequências estruturais e dinâmicas da interação entre dois ou mais eixos da subordinação. Ela trata especificamente da forma pela qual o racismo, o patriarcalismo, a opressão de classe e outros sistemas discriminatórios criam desigualdades básicas que estruturam as posições relativas de mulheres, raças, etnias, classes e outras. Além disso, a interseccionalidade trata da forma como ações e políticas específicas geram opressões que fluem ao longo de tais eixos, constituindo aspectos dinâmicos ou ativos do desempoderamento."


Para explicar o termo de forma didática, a professora utiliza a metáfora de uma encruzilhada, na qual diferentes eixos de poder (raça, etnia, gênero e classe), distintos e mutuamente excludentes, constituem avenidas que estruturam os terrenos sociais, econômicos e políticos. A sobreposição e o cruzamento desses eixos criam intersecções complexas que atravessam o viver de cada indivíduo de forma singular. Um exemplo são as mulheres negras, que estão frequentemente posicionadas em um lugar no qual o racismo, a classe e o gênero se encontram. Por consequência, estão sujeitas a serem atingidas pelo intenso fluxo de tráfego em todas essas vias.


Como esses dois conceitos se relacionam e o que isso tem a ver com saúde?

Em 2019, o Brasil era o nonȯ país mais desigual do mundo. Quando se trata de desigualdades em saúde, estamos falando de todos os fatores que podem influenciar as condições de saúde de um grupo ou população. Quando tais desigualdades são sistemáticas, injustas e evitáveis, podemos chamá-las de iniquidades.

Segundo a teoria ecossocial proposta por Nancy Krieger, epidemiologista e professora norte-americana, os padrões populacionais de saúde, doença e bem-estar são consequências dos modos de vida e trabalho de cada grupo social, determinados pelo arranjo econômico e político da sociedade. Ou seja, a saúde possui dimensões biopsicossociais, as quais se articulam mutuamente e são indissociáveis.

Desse modo, quando a interseccionalidade dos marcadores sociais e dinâmicos da diferença não é considerada no planejamento de políticas públicas e de saúde singulares para cada indivíduo, grupo ou população, as necessidades dessas parcelas são invisibilizadas, acentuando as iniquidades em saúde e fortalecendo, consequentemente, a política da morte.

Referências:

ALMEIDA, Silvio Luiz de. NECROPOLÍTICA E NEOLIBERALISMO. Caderno CRH, 2021. Disponível em: <https://periodicos.ufba.br/index.php/crh/article/view/45397/25569>. Acesso em: 17 jan. 2022.

CRENSHAW, Kimberlé. Documento para o encontro de especialistas em aspectos da discriminação racial relativos ao gênero. Revista estudos feministas, v. 10, p. 171-188, 2002.

GINI Coefficient by Country 2021. World Population Review, 2021. Disponível em: https://worldpopulationreview.com/country-rankings/gini-coefficient-by-country. Acesso em: 17 jan. 2022.

IGNACIO, Julia. O que é interseccionalidade?. [S. l.], 20 nov. 2020. Disponível em: https://www.politize.com.br/interseccionalidade-o-que-e/. Acesso em: 17 jan. 2022.

OLIVEIRA, Elda de et al. Contribuição da interseccionalidade na compreensão da saúde-doença-cuidado de homens jovens em contextos de pobreza urbana. Interface-Comunicação, Saúde, Educação, v. 24, 2020.

OLIVEIRA, Fernanda de; BASTOS, João Luiz; MORETTI-PIRES, Rodrigo Otávio. Interseccionalidade, discriminação e qualidade de vida na população adulta de Florianópolis, Sul do Brasil. Cadernos de Saúde Pública, v. 37, p. e00042320, 2021.

 
 
 

Comments


Post: Blog2_Post

Formulário de inscrição

Obrigado(a)

©2020 por Jornal A Sístole. Orgulhosamente criado com Wix.com

bottom of page