BLUES E OUTROS TONS DE LIBERDADE: A MÚSICA COMO INSTRUMENTO DE LUTA CONTRA O RACISMO
- Jornal A Sístole
- 20 de nov. de 2020
- 3 min de leitura

Por Marina Matos Souto
O racismo é um fenômeno social organizado em que o grupo racial dominante se usa de um imaginário preponderante de superioridade inata, com consequente inferiorização dos outros; a noção de inferioridade pode, inclusive, ser usada para a hierarquização das diversas raças/etnias não caucasianas. O grupo dominante categoriza indivíduos de acordo com sua origem racial e utiliza seus privilégios como arma para desvalorizar, desempoderar e alocar injustamente recursos e oportunidades para os julgados inferiores. O racismo é habilmente costurado no tecido cultural de uma sociedade, permitindo sua perpetuação em crenças normativas (estereótipos) e atitudes (preconceitos) direcionadas aos povos que não pertencem a “raça superior”, o tratamento injusto não ocorre apenas em esfera individual, é também institucional. Sendo assim, significa que o preconceito envolve políticas institucionais e/ou governamentais e as molda para reforçar, justificar e perpetuar uma hierarquia racial.
A noção da existência de uma sociedade racialmente hierarquizada é demonstrada pela permanência histórica de disparidades no que tange a educação, saúde, riqueza, pobreza e encarceramento; os piores índices socioeconômicos são observados entre pretos, pardos e indígenas. Existe uma tendência particularmente forte de negar o racismo no Brasil, com o mito da “democracia racial”. Um país com passado escravagista e, posteriormente, eugenista, tenta passar a noção de que foi construído pela convivência pacífica das raças, sendo que, na verdade, tem um vergonhoso histórico de extermínio, escravização, violência e estupro contra povos não caucasianos. A raça foi e continua muito relevante nas vivências e indicadores sociais de vários povos, negar sua existência, portanto, causa danos pelos seguintes motivos: perpetua o mito de oportunidades iguais, culpa negros e indígenas por condições adversas e permite que brancos vivam confortavelmente sem confrontar seus privilégios, os quais são nada menos que frutos da hierarquização racial.
A cultura e religião ocidentais foram infundidas com ideologias racistas. A desumanização do povo preto, por exemplo, era rotina em textos religiosos, cinema, teatro e publicidade, sendo subconscientemente - ou conscientemente – adotada e normalizada. Por outro lado, as manifestações culturais também foram veículo importante para a reação dos grupos oprimidos, com destaque para a música. A contribuição preta para a música é inegável e, infelizmente, menosprezada e/ou apagada. Estilos musicais como samba, rock, blues, gospel, soul, rap/hip-hop, funk e jazz têm contribuições indispensáveis do povo preto, e estas foram apagadas para que alguns desses gêneros apelassem ao ouvinte branco. A música serve não só como meio de denúncia e protesto contra o racismo, ela também é meio de celebração das características que foram marginalizadas por séculos, valorizando, por exemplo, a beleza, culinária e religião negras.
Para valorizar a excelência da música produzida por pretos e gerar reflexões sobre o racismo, trago uma lista de músicas que abordam o tema em diversas vertentes e gêneros musicais.
Referências:
1. WILLIAMS, David R.; LAWRENCE, Jourdyn A.; DAVIS, Brigette A. Racism and health: evidence and needed research. Annual review of public health, v. 40, p. 105-125, 2019.
2. ANDREWS, George Reid. O negro no Brasil e nos Estados Unidos. Lua Nova: Revista de Cultura e Política, v. 2, n. 1, p. 52-56, 1985.
3. COELHO, Wilma de Nazaré Baía; COELHO, Mauro Cezar. Música, raça e preconceito no ensino fundamental: notas iniciais sobre hierarquia da cor entre adolescentes. Afro-Ásia, n. 48, p. 311-333, 2013.
4. NEVILLE, Helen A.; GALLARDO, Miguel E.; SUE, Derald Wing. Introduction: Has the United States really moved beyond race?. In: The myth of racial color blindness: Manifestations, dynamics, and impact. American Psychological Association, 2016. p. 3-21.
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